O planejamento sucessório é uma alternativa preventiva ao inventário, muito menos burocrática que o procedimento judicial e que pode trazer benefícios, como a economia tributária e a proteção patrimonial.
A morosidade do judiciário brasileiro no julgamento dos processos é uma realidade conhecida por todos, de norte a sul, é unanimidade entre os advogados e as partes. Esta lentidão, que reflete diretamente na vida dos cidadãos, é acentuada nas varas que tratam de sucessão, nas quais herdeiros aguardam por anos a finalização de um processo de inventário – muitas vezes décadas, quando há litígio – na expectativa de finalmente obter definitivamente os bens que têm direito.
Segundos dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ)1, havia em 31 de julho de 2021 no estoque da justiça estadual 5.834.958 (cinco milhões, oitocentos e trinta e quatro mil e novecentos e cinquenta e oito) processos distribuídos nas 1.393 (mil, trezentas e noventa e três) unidades judiciárias que julgam as causas atinentes ao direito sucessório.
Neste panorama agoniante, vêm sendo criadas alternativas que sejam mais vantajosas para todos os envolvidos nesta situação que, por si só, já é bastante penosa, por envolver o óbito de um ente querido. A principal vantagem nesses novos mecanismos é a rapidez em resolver o quinhão e, em alguns casos, as responsabilidades que cabe a cada herdeiro. Entre eles, temos o planejamento sucessório. Esse instituto consiste no fato de um indivíduo, ainda em vida, distribuir os bens que acumulou de uma forma que seja mais rápida e menos onerosa do que um processo de inventário a ser feito no futuro.
De fato, devemos reconhecer que pensar em planejar a partilha dos seus bens ainda em vida não é uma tarefa prazerosa, pensar na morte ainda é um tabu muito grande. Entretanto, o planejamento sucessório, especialmente para os que possuem patrimônio considerável, previne litígios entre pessoas queridas, de modo a resguardar estas relações, e, por consequência, evita mais sofrimento em um momento extremamente doloroso. Além disso, também protege os bens na medida em que soluciona o conflito antes que estes se deteriorem e percam seu valor no mercado.
A economia tributária através do planejamento sucessório é bastante considerável, pois com o planejamento sucessório há formas lícitas de livrar-se da burocracia e custos extras. De início, podemos mencionar o Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD), o qual a alíquota varia entre 1% e 8% do valor do bem. É possível, inclusive, com a implementação do planejamento sucessório, eximir-se do pagamento deste tributo ou, respeitando os ditames legais, perseguir caminhos fiscais menos onerosos.
Para as unidades familiares que possuem um patrimônio expressivo é interessante o instituto da holding familiar. Nessa hipótese, a matriarca ou o patriarca da família constitui uma holding familiar, onde introduz seus herdeiros como sócios dessa sociedade.
Um ponto importante na constituição de uma holding familiar é que o patriarca ou a matriarca podem incluir cláusulas condicionantes no planejamento sucessório, para que suas vontades sejam cumpridas mesmo após seu falecimento. Assim, quando infelizmente vier a ocorrer o óbito deste indivíduo, já que nenhum de nós é eterno, todas as partes envolvidas já saberão de antemão os seus direitos e posições dentro da estrutura que foi criada pelo de cujus.
Quando um dos bens do planejamento sucessório é uma empresa, também é importante que já esteja predeterminado – de acordo com as habilidades e formações acadêmicas e técnicas de cada membro – o método de funcionamento e suas respectivas colocações dentro da estrutura societária após a morte da pessoa que era responsável pela empresa, de forma que negócio não se desmonte rapidamente.
Uma pesquisa realizada pela empresa de consultoria PwC concluiu que 75% das empresas familiares encerram suas atividades após serem sucedidas pelos herdeiros2, e na maior parte dos casos, é justamente a falta de organização prévia e estratégica que leva as organizações familiares para esse lamentável fim, pois os desentendimentos familiares naturais se sobrepõem aos interesses empresariais. Essa consequência trágica é terrível não somente para a unidade familiar envolvida, como também para todo o país, uma vez que 90% das empresas brasileiras são comandadas por entidade familiar.
Considerando isso, é necessário preparar a empresa para que esta não desmorone após o fim da vida de sua espinha dorsal. É preciso, com o auxílio de profissionais da área, analisar cuidadosamente não somente a sociedade como também os membros que compõe a família, que serão a próxima geração de gestores, para idealizar um plano que tenha altíssima probabilidade da empresa se perpetuar com a morte da matriarca ou patriarca.
Importante frisar que não existe uma fórmula exata para ser usada em todos os casos. Ao contrário, é recomendado uma avaliação multidisciplinar, que envolva contadores, administradores de empresa experientes além de, claro, bons advogados, que são elementares na confecção de instrumentos jurídicos detalhados e eficientes, de modo a aproximar ao máximo o planejamento sucessório ao sucesso absoluto.
O que se pretende, ao final de todo o trabalho de planejamento sucessório, é conectar o Direito de Família e o Direito Empresarial, para que estes possam conviver harmonicamente, de forma que cada indivíduo consiga atuar estritamente de acordo com a sua posição dentro da cadeia hierárquica societária, de acordo com o que fora preestabelecido no contrato social, acordo de sócios ou qualquer outro instrumento contratual.
Por fim, é essencial ressaltarmos que o instituto da holding familiar não será benéfico para todas as famílias indistintamente. É necessária uma análise minuciosa de especialistas que possam indicar a melhor estratégia para cada unidade familiar, que pode passar pela adoção de uma estrutura multissocietária que dilua a administração (o que confere poderes limitados a cada titular), como também pela realização de operações mais simplificadas, como doações em vida com cláusula de usufruto vitalício, testamento ou até mesmo o inventário extrajudicial, entre outros institutos.
Fonte: Migalhas